De onde começa uma relação? Como explicar a inexplicável força que nos leva ao encontro do outro? Paixão, atração, identificação, curiosidade, imaginação. Pra mim, toda nova relação e todo processo de construir uma comunidade começa com um comichão de que algo novo me espera, algo que imagino que vai valer a pena. É como um chamado para uma aventura.
Muitos projetos de design de comunidades falham por não investir tempo e energia em explosões de imaginação utópica. Às vezes parece até que a nossa capacidade imaginativa foi capturada - falta tempo, coragem, confiança talvez.
E pior, no minuto em que começamos a imaginar que as coisas podem ser diferentes, parece que sempre tem alguém que nos puxa de volta com todo o seu cinismo para nos lembrar que vai ser difícil, trabalhoso e pouco efetivo sequer tentar viver algo diferente. Quão diferente é quando ao termos nossas próprias explosões utópicas, alguém ao nosso lado nos diz: isso é muito foda, vai e estou aqui com você.
Parece que no processo de nos tornarmos adultas vamos aprendendo que qualquer coisa que excede a racionalidade não tem valor. É assim que magia, ludicidade, intuição, características do processo de imaginar, são substituídas por planos, objetivos e metas. Mas pra mim, um plano sem imaginação é desprovido de vida, e provavelmente limitado ao que já está posto - e o que já está posto como sabemos bem se resume a individualismo, ausência de comunidade e uma vida ditada por consumir, distrair e destruir.
"A imaginação não é uma fuga da realidade. A imaginação aprofunda e enriquece a realidade, acrescentando textura, profundidade, dimensão, sentimento e possibilidade. A verdade é: tudo o que é criativo e nos enobrece é, em última análise, objeto da imaginação. Sem a imaginação, a realidade é muito plana, muito pragmática, desprovida de cor e fervor. Para ir além do possível até o impossível, precisamos imaginá-lo." Norman Fischer
Imaginar é como um chamado por expansão, e por isso a imaginação já é por natureza coletiva. Ela nos desloca do centro do nosso umbigo para o mundo, e quando a gente se junta em roda para imaginar fortalecemos nossas relações. É como se a imaginação fosse alimento da paixão - nos conectamos com as possibilidades incríveis do que podemos viver juntas.
Uma relação desprovida de imaginação provavelmente está perdendo a vida e se o seu projeto de comunidades não está indo pra frente, talvez seja o caso de convidar mais gente para imaginar junto. Se engana quem pensa que imaginar junto precisa necessariamente significar criar uma possibilidade única. Não precisamos de um sonho único para conviver e colaborar, afinal, o mundo não precisa de apenas uma possibilidade, precisa de várias.
Qual problema a gente quer resolver?
No Design de Conexões, abordagem que desenvolvemos no Instituto Amuta, quebramos a narrativa comum de que todo projeto de design precisa começar de um problema.
Para o pesquisador e designer Caio Vassão, raramente as inovações partem de um problema ou demanda social. Para ele, a inovação surge quando ampliamos nosso repertório e começamos a experimentar nas nossas próprias vidas e comunidades algo novo. É um processo muito mais intuitivo, criativo e sensorial do que racional. É com certeza mais afetivo e mais subversivo, convidar as pessoas para uma aventura, uma festa talvez.
Sim, subversivo também, pois essa ideia de que tudo que a gente faz na vida é resolver problemas e pagar boleto sequestra progressivamente o nosso tempo.. Quando estamos trabalhando para resolver um problema, temos pressa, afinal, o prazer só ocorre quando alcançamos a meta.
Quando estamos trabalhando e produzindo, por mais prazeroso que nosso trabalho seja, existe sempre a pressa como pano de fundo. Terminar, finalizar, entregar é como o gozo do trabalho, e por isso a produtividade é inerentemente acelerada.
Já o tempo da festa é um tempo parado. Na festa não existe um objetivo, uma entrega final. Pensa comigo: ninguém quer que uma festa boa termine, não é mesmo? É por isso que o tempo da festa é um tempo no qual estamos inteiras, presentes. É um tempo em que queremos permanecer. (Fonte: Byung Chul Han)
Precisamos viver as nossas relações e nossos projetos de comunidades menos como um trabalho com um empilhamento de problemas a serem resolvidos e um lugar específico a se chegar, e mais como uma festa na qual estamos presentes, inteiras e abertas.
“Nós celebramos a festa. Não se pode, porém, celebrar o trabalho. Podemos celebrar a festa, pois ela fica parada como uma construção.” Byung Chul Han
Tudo que vivemos hoje, foi imaginado em algum momento por alguém. Já parou pra pensar o quão importante pode ser abrir espaço para imaginar novas possibilidades agora mesmo?
Uma missão para criação da possibilidade
Pesquisa (que embasa a missão) Caminhar ao ar livre nos amplia e aumenta a nossa criatividade para criação de novas possibilidades.
Experimentos demonstram que caminhar estimula a ideação criativa (tanto durante quanto após a prática), e os efeitos são ainda mais significativos quando a caminhada é feita ao ar livre . Nos experimentos, caminhar aumentou 81% da criatividade dos participantes no GAU, e 23% das pontuações dos participantes no CRA, maior impulso criativo residual, mais capacidade de geração de analogias criativas (Fonte: Give Your Ideas Some Legs: The Positive Effect of Walking on Creative Thinking - Marily Oppezzo and Daniel L. Schwartz - Stanford University (Link)
Nome do artefato: Deslocamentos (Inspiração Carol Bergier) Tipo: experiências Categoria: possibilidade Objetivo: Se deslocar fisicamente para se conectar com a intuição e assim ampliar sua capacidade de imaginar novas possibilidades. Tempo: Dificuldade: difícil
Passo a passo:
Escolha um local significativo para a comunidade para fazer essa atividade. Caso você esteja em um centro urbano, você pode aproveitar a pulsação da cidade como inspiração e caso esteja na natureza, aproveite para aprender com ela.
Encontre as pessoas em um ponto onde possam relaxar e se sentar. Pode ser um parque, um museu, uma vista. Sentem-se em roda e compartilhem a intenção.
Em silêncio (ou escutando uma playlist especial) façam uma caminhada de 20 minutos com uma câmera fotográfica em mãos. Tire fotos de tudo aquilo que te chamar atenção - se conecte com sua capacidade de se expressar através da fotografia.
Retornem a um ponto onde possam se sentar e conversar e tire um tempo para olhar as suas imagens e perceber o que há de comum e de diferente nos registros que você fez. Existe algo que parece chamar mais a sua atenção? O que parece que a vida está convidando a comunidade a criar?
Se tiver esse recurso, imprima uma foto de cada pessoa e disponha no centro da roda, como uma exposição enquanto as pessoas vão para uma nova caminhada, agora em duplas.
Em duplas, voltem a caminhar por mais 20 minutos, agora conversando sobre os registros feitos. Tente contar uma história: o que essa imagem te faz sentir ou pensar? Como você imagina que suas relações e comunidades podem ser e fazer diferença na sua vida e no mundo?
Em volta das imagens, abra um espaço para que todas respondam: quais possibilidades imaginamos que podem nascer a partir desse grupo? Caso esteja em um grupo muito grande, você pode controlar o tempo de fala (1 min para cada, falar em 1 tweet, ou deixar mais livre).
Peça que cada pessoa pegue a sua imagem, e cole em um papel com palavras e um pequeno texto da possibilidade que imaginou. Você pode guardar em uma caixa ou caderno coletivo, e eleger uma pessoa como guardiã das possibilidades. Sempre que sentir necessidade, voltem a esses registros para observar se algo se movimentou ou modificou e como podem continuar se apoiando.
PS: Caso não possa fazer a caminhada, selecione algumas imagens para dispor para o grupo. Você pode usar sites de bancos de imagens como Unsplash, ou usar uma temática como: líderes famosas, séries e filmes, esportes, lugares do mundo, etc. Outra opção é usar a inspiração de sistemas vivos, através do site Ask Nature.
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